Pedro Riva e Raissa Bressanim, sócios do Riva Bressanim Advogados. Especialistas em Direito do Trabalho, Processo do Trabalho e Direito Coletivo pela PUC/SP. Membros da Seccional de São Paulo da OAB/SP.
Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo
Recentemente, o Ministério Público do Trabalho (MPT) publicou uma nota técnica em que considera a covid-19 como doença ocupacional. Pouco tempo depois, o Ministério da Economia, por meio da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, publicou orientação sobre o assunto. Para o órgão, esse enquadramento só seria possível após perícia médica.
Em sua Nota Técnica SEI nº 56376, a secretaria afirma que a covid-19 “pode ou não ser considerada doença ocupacional, a depender das características do caso concreto e da análise realizada pela perícia médica federal ou pelos médicos responsáveis pelos serviços de saúde das empresas”.
A nota tem função de orientar. Ainda de acordo com a nota técnica, a secretaria diz que a covid-19, como doença comum, não se enquadra no conceito de doença profissional por não estar listada no Decreto nº 3.048, de 1999, mas pode ser assim caracterizada se aplicada a seguinte previsão da mesma norma: doença adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente. Mais especificamente, a nota afirma que “as circunstâncias específicas de cada caso concreto poderão indicar se a forma como o trabalho foi exercido gerou risco relevante para o trabalhador. Além dos casos mais claros de profissionais da saúde que trabalham com pacientes contaminados, outras atividades podem gerar o enquadramento”.
Portanto, não há como produzir prova cabal e inequívoca que a contaminação da covid-19 ocorreu no local de trabalho. Contudo, há como obter indícios de que a contaminação tenha ocorrido no local de trabalho, caso tenha surto de doenças na empresa, não exista o distanciamento social, não haja a utilização de máscaras, dentre outras medidas imprescindíveis para dirimir a contaminação. Assim, cabe às empresas, conforme determina a legislação, garantir aos empregados saúde e segurança nos locais de trabalho e, caso demandadas em Juízo, comprovar que tomaram todas as medidas de proteção contra a disseminação da doença. É bom lembrar que em atividades específicas como em hospitais, por exemplo, a prova tem que ser inconteste, pois referidos trabalhadores estão mais expostos à doença.
Vale ressaltar que não há um órgão específico soberano. Entendemos que carece de amparo legal ao MPT apontar se a covid-19 é enquadrada como doença ocupacional. Na esfera administrativa, quem tem competência para declarar se a doença é do trabalho ou tem nexo com o trabalho é do INSS, por meio de seus peritos, ressalvando que esta regra geral, em casos específicos, pode ser levada ao Poder Judiciário.
Por outro lado, falando sobre as sanções contra as empresas, a medida também pode impactar no pagamento de contribuições previdenciárias. Com aumento do número de acidentes de trabalho que pode ocorrer com a caracterização da covid-19 como doença ocupacional, as empresas correm o risco de terem alíquota maior de Riscos Ambiental do Trabalho (RAT) – que se trata da nova denominação do Seguro Acidente do Trabalho (SAT).
Nesse ponto, é possível questionar a quem interessa tornar a covid-19 uma doença ocupacional. Esperamos e não acreditamos que não haja um desejo dos órgãos de governo em classificar a covid-19 como doença profissional com o objetivo de aumentar a arrecadação. De todo modo, caso haja orientação neste sentido, é imperioso que as empresas assegurem aos seus empregados e prestadores condições de trabalho que impeçam o contágio da doença, com a estrita observância das orientações da OMS, Ministério da Saúde e Ministério Público do Trabalho.